Pluriverso Auricular by Cama Desfeita

Último improviso no espaço P.A.
Gravado no dia 22 de dezembro de 2013.

"O fenômeno musical chamado noise apresenta uma vontade de superar o Simbólico e encontrar uma outra materialidade para o que seria a 'combinação de sons agradáveis'. Mas é falso pensar que se trata de um outro conteúdo que recebe um tratamento estético, sem perguntar pelo quê estético dessa manifestação. Há, obviamente, a tentativa de escape da padronização industrial imposta à música popular. Isso já levanta uma questão – a do popular ou erudito – que situa o noise numa fronteira. Não se trata de música ligeira. Na verdade, o noise traz para si conceitos distantes de grande parte de seu contexto social, a saber, o de música sacra. É que a (possível) sacralidade do noise remete menos à comunhão cristã ou ao mantra hindu, do que a um êxtase primitivo. Não leva longe falar em termos de catarse nesse âmbito, senão numa sublimação perigosa que se dispõe a enfrentar a regressão da audição nos mesmos termos, ainda que não com o mesmo arsenal. O perigo aludido não pode ser evitado com um simples desvio formal do padrão, mas é característico da boa arte o correr riscos. De qualquer forma, não há um experimento, senão uma construção. A dificuldade maior na interpretação, aqui, não reside no vocabulário, mas na sintaxe nova. O tempo do 'ruído' não organiza um desejo, é o desejo de um ruído que abre um tempo para uma peculiar organização. Assim, eventos de noise costumam remeter ao origami, como construção feita de dimensões mais do que de níveis. A experiência sensual da música introduz na estrutura da audição uma borda casual, e a execução se aproxima do que se costuma entender por performance. O noise é uma música do hic et nunc, e há uma grande diferença entre esse tipo de experiência num player .mp3 e ao vivo; mesmo um ensaio é menos a repetição exaustiva de um ideal futuro do que a antecipação desse futuro metonimicamente."
Nils Skare — Notas sobre o "noise"
22 de dezembro de 2013

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